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Nayib Bukele, presidente de El Salvador | Foto: Reprodução/Presidência de El Salvador
Edição 186

El Salvador: tolerância zero com o crime organizado

O presidente Nayib Bukele comprova, na prática, o que o senso comum já dizia: prender bandidos é a melhor forma de reduzir a criminalidade

Gabriel de Arruda Castro
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Com uma população pequena (6,3 milhões de habitantes) e um território menor que o Estado de Sergipe, El Salvador era até pouco tempo atrás o país mais perigoso do mundo. Em 2018, por exemplo, a taxa de homicídios no país foi de 52 por 100 mil habitantes. 

Foi.

Se mantiver o ritmo de 2023, El Salvador vai fechar o ano com um índice de 2,3 assassinatos por 100 mil habitantes — praticamente o mesmo número registrado em 2022 no Canadá, o país mais seguro das Américas.

E não há como explicar a guinada sem atribuir a queda ao presidente salvadorenho, Nayib Bukele. Eleito em 2019, com apenas 37 anos de idade, ele se tornou uma figura popular graças à estratégia de enfrentar as gangues que tiravam a paz dos salvadorenhos. 

O sucesso de Bukele na segurança não apaga alguns enigmas sobre seu passado político nem as críticas por atitudes antidemocráticas. Mas explica por que ele tem índices de aprovação altíssimos.

Nayib Bukele, presidente de El Salvador | Foto: Reprodução/Wikimedia Commons
De prefeito a presidente

A política da América Central parece ser ainda mais cheia de reviravoltas do que a brasileira. A ascensão de Bukele é um bom exemplo disso.

O presidente é filho de um casal de imigrantes vindos da Palestina. Seu pai, originalmente cristão, se converteu ao Islamismo e tornou-se um imã (espécie de sacerdote). A mãe permaneceu católica. De família rica, Bukele trabalhou em empresas do pai até que, em 2012, aos 31 anos, foi eleito prefeito da pequena cidade de Nuevo Cuscatlán. Seu partido: a FMLN, uma ex-organização guerrilheira que se converteu na principal sigla de esquerda do país. Sim, de esquerda. Aliás, a FMLN integra o Foro de São Paulo.

Em 2015, no mesmo partido, ele venceu a disputa pela prefeitura de San Salvador, a capital nacional. Em 2017, ainda prefeito, foi expulso do partido por indisciplina — não sem antes acusar a sigla de adotar medidas “neoliberais”.

Ou seja: Bukele começou sua carreira no maior partido de esquerda de El Salvador, e só deixou a sigla porque foi removido.

Depois disso, Bukele resolveu formar o próprio partido, o Nuevas Ideias. A legenda não obteve registro a tempo de disputar as eleições presidenciais. Por isso, ele concorreu à Presidência como membro de uma sigla menor, a GANA. Com seu perfil carismático, boa oratória e um discurso antissistema, obteve 53,1% dos votos.

A vitória realinhou as forças políticas de El Salvador. Todas as eleições desde 1989 haviam sido vencidas pela FMLN ou pela ARENA, de perfil conservador. 

O mínimo sinal de ligação com as gangues, inclusive certos tipos de tatuagens, tornou-se suficiente para levar alguém à cadeia. De lá para cá, foram mais de 70 mil prisões, a maior parte alojada em um novo complexo prisional de dimensões faraônicas

Tolerância zero com o crime organizado

A postura rígida de Bukele contra os grupos criminosos surpreende quando se leva em conta que, nas duas ocasiões em que foi prefeito, a imprensa local encontrou indícios de que ele fez acordo com gangues locais para evitar conflitos — o que era comum por parte da FMLN.

As acusações persistiram durante o mandato presidencial e tiveram implicações embaraçosas para Bukele. Em dezembro de 2021, os Estados Unidos impuseram sanções a três aliados do presidente pelo pacto com os grupos criminosos. “Em 2020, o governo do presidente salvadorenho proveu incentivos financeiros para as gangues salvadorenhas MS-13 e Barrio 18 para assegurar que os incidentes de violência de gangues e o número de homicídios confirmados permanecessem baixos”, diz o comunicado do governo norte-americano.

Membros da gangue salvadorenha MS-13 | Foto: Reprodução/YouTube

No início do mandato, o governo de Bukele obteve algum progresso, mas o apoio do Congresso só avançou de fato a partir de 2021, quando sua coalizão elegeu dois terços do Parlamento.

Na primeira sessão, o novo Congresso removeu todos os cinco membros da Suprema Corte. O argumento: os ministros da Corte violaram a Constituição ao impedir o trabalho do Ministério da Saúde durante a pandemia. O processo de destituição durou uma hora. Raúl Melara, o procurador-geral da República que investigava a ligação de Bukele com as gangues, também foi substituído.

Bons resultados e alta aprovação

Se o governo de Bukele tinha um acordo tácito com as gangues, fato é que as coisas mudaram a partir de março de 2022. Entre os dias 25 e 27, a gangue MS-13 matou 87 pessoas — número intolerável até mesmo para os padrões de El Salvador. Em um único dia, foram 62 homicídios. Ato contínuo, Bukele decretou regime de exceção, o que lhe permitiu prender suspeitos sem a necessidade de autorização prévia da Justiça. O mínimo sinal de ligação com as gangues, inclusive certos tipos de tatuagens, tornou-se suficiente para levar alguém à cadeia. De lá para cá, foram mais de 70 mil prisões, a maior parte alojada em um novo complexo prisional de dimensões faraônicas. El Salvador agora tem a maior taxa de encarceramento do mundo.

Grupos de defesa dos direitos humanos, como a Anistia Internacional, protestaram. Mas Bukele não pareceu se incomodar. Logo depois das primeiras prisões em massa, ele mandou uma mensagem aos criminosos usando o púlpito presidencial: “Há rumores de que querem começar a se vingar das pessoas honradas. Façam isso, e não haverá um momento de comida na prisão. Vamos ver quanto duram seus companheiros lá dentro. Juro por Deus que não comem um arroz. Vamos ver quanto tempo duram. E não me importa o que digam os organismos internacionais. Que venham a proteger a nossa gente e levem os bandidos, se gostam tanto deles”.

As represálias dos criminosos não vieram. A operação de Bukele derrubou os índices de criminalidade em El Salvador e ofereceu a uma população assustada a possibilidade de levar uma vida normal. Em diferentes pesquisas, o mandato de Bukele tem obtido uma taxa de aprovação acima de 90%. O índice subiu conforme a violência diminuiu.

Nayib Bukele, presidente de El Salvador | Foto: Reprodução/Gabinete da Presidência de El Salvador
Flerte com o populismo

Bukele não é um presidente convencional. Na verdade, ele dá sinais de ser um populista. Ainda em 2020, enfrentando embates com um Congresso hostil, o líder salvadorenho foi (num domingo) até o prédio do Parlamento acompanhado por apoiadores e tropas militares. Lá, ocupou a cadeira do presidente da Casa e orou em silêncio por alguns minutos. Foi uma forma peculiar de pressionar os parlamentares a aprovar reformas propostas pelo seu governo. Bukele, aliás, não especifica se é cristão ou muçulmano. O gesto de oração no Congresso, com as mãos juntas perto do rosto em formato de concha, é mais comum entre adeptos do Islã.

Em 2021, os ministros indicados por ele para a Corte Constitucional deram sinal verde para sua campanha à reeleição, embora a Constituição vede a prática. A eleição acontecerá no ano que vem. Em junho deste ano, sua coalizão aprovou uma medida que reduz de 84 para 60 o número de cadeiras no Congresso. Se tiver tempo, ele já disse que pretende levar adiante um projeto ambicioso de unificação de oito países da América Central, que passariam a ser uma única nação. 

Efeito cascata

Bom em oratória, fluente em inglês e hábil com as redes sociais, Bukele chamou a atenção fora do país. O turismo cresceu 32% desde 2019 — o quarto maior aumento entre todos os países do mundo, segundo o Barômetro do Turismo Mundial.

Na economia, o método Bukele também tem dado resultados. O dólar é a moeda oficial de El Salvador desde 2001. Mas, graças à Lei do Bitcoin, sancionada por ele em 2021, empresas que atuam com criptomoedas terão em El Salvador a segurança que outros países não oferecem. O Banco de Desenvolvimento de El Salvador assegura a conversão instantânea de bitcoins em dólares. 

Ilustração: Shutterstock

O ambiente de negócios tem melhorado. O Departamento de Comércio Exterior do governo dos Estados Unidos, por exemplo, afirma que “o governo Bukele continua fazendo esforços para atrair investimentos estrangeiros, e adotou medidas para reduzir a burocracia onerosa e melhorar as condições de segurança”.

Bukele se apresenta como um líder efetivo, com um discurso claro e direto. As gangues aterrorizavam a população? Ele desmantelou as gangues. Faltavam vagas nas prisões? Ele construiu. Organismos internacionais protestaram contra as prisões em massa? Ele deu uma banana para os organismos internacionais. A Suprema Corte rejeitava algumas de suas políticas? Ele e seus aliados destituíram cinco membros da Suprema Corte, além do procurador-geral da República.

É difícil saber qual é a religião de Bukele. É difícil saber quais são suas convicções pessoais. E é difícil saber como seu governo terminará. Mas, se o sucesso de El Salvador deixa algo claro, é que prender criminosos diminui a criminalidade. Para o assombro de grupos progressistas.

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3 comentários
  1. Andrea Danyluk
    Andrea Danyluk

    Meu testemunho é real, invisto em El Salvador a mais de 20 anos. Conheço a veracidade de cada palavra escrita nesta matéria e reafirmo. É o Bolsonaro Salvadorenho, livre para fazer as mudanças que o país precisava e nunca houve tamanha prosperidade. O povo trabalhador e muito feliz, vão reelegê-lo. O cenário, graças ao presidente é só bom Deus, não poderia ser melhor. Gostaria muito de que o Brasil d
    Se espelha-se em algo exatamente igual. Simples Assim! Espero mesmo e de coração poder dizer de boca cheia, a um certo ativista, PERDEU MANÉ !!!!

  2. Erasmo Silvestre da Silva
    Erasmo Silvestre da Silva

    Bukelie e El Salvador é o melhor exemplo a ser seguido pelo Brasil

  3. Rosangela J . Dias
    Rosangela J . Dias

    Nossa quantos jovens perdidos no mundo do crime.

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